Enquanto Scott Bessent, secretário do Tesouro dos Estados Unidos, negociava com a China na Suíça até tarde da noite de 11 de maio, autoridades comerciais do resto do mundo estavam desocupadas.
Muitos haviam chegado a Washington para conversas, buscando desesperadamente acordos comerciais, apenas para descobrir que os negociadores americanos estavam no exterior e suas reuniões foram adiadas ou canceladas.
Um funcionário, que esperava apresentar argumentos meticulosamente elaborados sobre regras de vacinação bovina e controle cambial, aproveitou a oportunidade para visitar o recém-reformado Museu Nacional do Ar e Espaço. Ele então partiu “tão de mãos vazias quanto antes”.
A ambição dos Estados Unidos é assinar 90 acordos comerciais em 90 dias. O relógio começou a contar em 9 de abril, quando tarifas recíprocas sobre aproximadamente o mesmo número de países foram suspensas, e continuará até o prazo final de 8 de julho.
Passado mais de um terço desse período, apenas dois acordos foram anunciados. Um com o Reino Unido, um aliado com o qual os Estados Unidos têm dialogado há uma década. O outro com a China, um rival com o qual o presidente Donald Trump iniciou uma feroz guerra comercial. As tarifas foram reduzidas em ambos os casos; nenhum dos países fez grandes concessões aos Estados Unidos.
Os 88 países restantes empregaram bastante charme diplomático na tentativa de avançar seus casos, mas fizeram progressos lentos e desiguais. Nenhuma equipe de negociação permaneceu na frente da fila por muito tempo. Discutir os detalhes de um acordo pode levar a uma rápida queda de posição. À medida que o prazo se aproxima, os riscos aumentam. Ninguém quer ficar de fora em 8 de julho.
Desde meados de abril, o governo Trump priorizou cerca de 20 economias, entre as quais grandes parceiros comerciais que seriam fortemente penalizados pelas tarifas recíprocas, como a União Europeia, Japão e Vietnã, bem como alguns países menores, como Fiji.
Uma seleção de líderes com quem Trump se dá bem, como Javier Milei, da Argentina, também entrou na lista. Quanto maior o parceiro comercial, maior a dor que os consumidores americanos sentiriam na ausência de um acordo. Autoridades acreditam que as negociações com Reino Unido e Fiji são um sinal útil de seus desejos para países que estão mais atrás na fila, e que isso deveria acelerar outras negociações.
Dado o caráter tumultuado das conversas até agora, tais racionalizações não são totalmente convincentes. Todas as discussões estão vulneráveis aos caprichos presidenciais.
Inicialmente, a prioridade dos Estados Unidos eram os grandes exportadores do leste asiático, como Japão e Vietnã. Mas depois que Ishiba Shigeru, primeiro-ministro do Japão, disse que a insistência americana em excluir tarifas setoriais das negociações era injusta, a Índia roubou seu lugar —apenas para perder terreno devido ao ritmo lento de suas próprias negociações.
Tendo perdido o status de prioridade, funcionários indianos apresentaram uma moção à OMC (Organização Mundial do Comércio), buscando endurecer seus controles de exportação para os Estados Unidos. Depois que os negociadores de Trump receberam uma calorosa recepção da Suíça no fim de semana, o presidente disse que o país seria promovido na fila.
Apenas a UE manteve uma posição consistente durante todo o processo: no final da fila. Trump chamou o bloco de “mais desagradável que a China” como parceiro de negociação. De forma mais diplomática, Bessent observa que as conversas são difíceis porque “os italianos querem algo diferente dos franceses”.
Três temas se destacam até agora. O primeiro, e mais importante, é que nenhum país consegue manter a atenção dos Estados Unidos por muito tempo. Em tempos normais, acordos comerciais são negociados bilateralmente. Mesmo definir termos gerais, que é o que Trump está tentando fazer no momento, costuma levar anos.
Os negociadores americanos parecem acreditar que sua atual abordagem acelerada oferece vantagem. Se encontrarem um obstáculo com um país, bem, sem problema —podem simplesmente passar para o próximo. Veja o que aconteceu ao Japão quando pediu aos Estados Unidos para remover sua tarifa de 25% sobre importações de automóveis.
A dificuldade é que, à medida que diferentes países chegam à frente, as esperanças de seus negociadores aumentam. Talvez sejam eles que encantarão o governo Trump para conseguir um acordo excepcionalmente bom.
Por exemplo, a Índia também tentou persuadir os Estados Unidos a remover tarifas sobre carros e aço como parte de um acordo “zero por zero”. No entanto, apenas o Reino Unido ganhou qualquer exceção desse tipo, e mesmo assim para apenas 100 mil carros por ano. À medida que essas tentativas fracassam, a rotatividade é o resultado. Uma autoridade vietnamita diz que a janela de oportunidade fica cada vez menor.
BARREIRA DE PEQUIM
Em seguida está o fator China. Países de fora da UE têm duas superpotências para agradar. Em 14 de maio, autoridades chinesas atacaram o acordo do Reino Unido com os Estados Unidos, alegando que ele indiretamente visa a China.
Sob os termos do acordo, o Reino Unido escapa de tarifas sobre exportações de aço, mas apenas se os Estados Unidos tiverem voz sobre quem possui suas usinas. Outras medidas de “segurança nacional” no acordo também irritaram a China. Tais reclamações surgirão novamente. O Japão temia que as exigências americanas sobre bens estratégicos irritassem a China.
O terceiro tema diz respeito a pontos de discórdia imprevistos. Países que trocam centenas de milhares de mercadorias a cada ano frequentemente têm queixas específicas.
Autoridades britânicas reclamaram com seus homólogos americanos sobre a qualidade da carne bovina do Tio Sam. Funcionários americanos exigiram que políticos japoneses liberalizassem seu mercado de arroz, um tabu político, e fizeram alegações infundadas de controle cambial contra a Tailândia.
Às vezes, as disputas têm pouco a ver com comércio. Em 1º de maio, a Tailândia retirou as acusações contra Paul Chambers, um acadêmico americano preso por lèse-majesté (insulto à realeza), em um movimento que autoridades tailandesas insistiram não ter relação com as negociações comerciais. Danças diplomáticas sobre tais questões normalmente levariam anos. Trump tem menos tempo, o que significa que acordos podem cair por terra.
Os Estados Unidos não vão cumprir sua ambição original de assinar 90 acordos comerciais até 8 de julho. Mais acordos, no entanto, terão sido assinados até essa data. E as negociações com muitos países continuarão além do prazo, com seus funcionários esperando uma extensão da atual pausa tarifária para ajudá-los a passar por esse período.
Ao mesmo tempo, Trump precisará mostrar que suas ameaças são críveis, a fim de obter concessões, afirma Josh Lipsky do think-tank Atlantic Council: “Haverá alguns exemplos a serem dados”. Para a maioria dos países, o objetivo não deve ser chegar à frente da fila. Deve ser evitar cair para o final.