Peço desculpas à rara leitora e ao raro leitor que não gostam de jornalistas na primeira pessoa do singular.
A rainha do jornalismo brasileiro, Dorrit Harazim, também desaprova e nunca usa. O excelentíssimo senhor marido dela, Elio Gaspari, é da mesma escola.
Sérgio de Souza, da primeira Redação da revista Realidade que mudou, em 1966, o jeito de fazer jornalismo no Brasil, fundador também da revista Caros Amigos, “a primeira à esquerda”, ao contrário, defendia que como testemunha dos fatos o repórter podia escrever na primeira pessoa.
Sou muito influenciável e vivo pressionado entre as duas correntes que respeito deveras.
Dito isso, confesso: tudo que eu gostaria de fazer na vida, e já não é de hoje, se resume a escrever e falar de jogos de futebol. Cumpri o papel durante anos de denunciar as mazelas e quero passar a missão aos mais jovens.
Os fatos não deixam.
Veja a CBF.
Pode surgir do nada um tal Samir Xaud e virar presidente da confederação que deveria cuidar do futebol brasileiro?
Um cidadão cuja biografia não o enaltece nem como médico, acusado de fraude em hospital que dirigiu em Roraima —e suspenso por dois anos, como perito, porque em vez de fazer laudo sobre a perna de motoqueiro acidentado, fez sobre o braço?
Ele é filho do presidente, por quatro décadas, da Federação Roraimense de Futebol que, como se sabe, tem serviços inestimáveis prestados ao nosso futebol, assim como a federação das Ilhas Maldivas tem para o futebol mundial.
Pior, embora ele negue, os que o inventaram revelam, em off, o nome de seu padrinho: o ministro Gilmar Mendes.
A coluna também se nega a acreditar e desperdiça espaço tão nobre nesta Folha para tratar do assunto, em vez de dedicá-lo à cobertura do mais antigo clássico paulista, entre Corinthians e Santos.
Ou à justa vitória do São Paulo sobre o Grêmio, mesmo com um pênalti à brasileira como as maracutaias da Casa Bandida do Futebol.
Ungir Xaud é algo tão desbaratado que chega a ser ofensivo ao Brasil, extrapola o futebol. Escárnio.
Claro, você pode dizer: “Ué, se Teixeira$Marin$Nero$Caboclo$Rodrigues foram, por que Xaud não pode ser?”.
Até faz sentido a pergunta, mas, com exceção de Ricardo Teixeira, que não passava de genro do poderoso chefão João Havelange, todos os demais tinham ocupado cargos importantes na apodrecida estrutura do futebol nacional.
Se passo por aqui para falar sobre tema tão entediante, por repetitivo, e aparentemente insolúvel, é porque para alguma coisa Xaud serviu: uniu contra ele as duas ligas de clubes e dos 40 que disputam as Séries A e B, e votam na CBF, 32 assinaram manifesto em torno de nome dissidente, o de Reinaldo Carneiro Bastos.
Trata-se do presidente da Federação Paulista há dez anos. Ele a tirou do noticiário policial, organiza o melhor e mais rentável campeonato estadual do país, por isso, aliás, não admite que o tempo dos estaduais acabou, faz parte e se beneficia da estrutura podre que confere às federações o poder decisivo na eleição da CBF.
Não seria a melhor solução, apenas a menos ruim, a que a maioria dos clubes gostaria, o que não é pouca coisa.
E olhe que as bets pressionaram contra ele.
Eu, torcedor, confesso, mais uma vez: perdi.