Em uma estufa na cidade de Mesa, no Arizona (EUA), torres com cerca de 3 metros de tomates, pepinos e outros vegetais variados se erguem em direção ao céu, banhadas por luz natural difusa.
“Podemos cultivar dez vezes mais alimentos usando de 90% a 98% menos água”, diz Troy Albright, fundador da True Garden, enquanto caminha por fileiras de alface americana, manjericão e bulbos de funcho do tamanho de bolas de softbol, cultivados em um ambiente vertical aeropônico —que recircula água rica em nutrientes de um reservatório até as mudas com raízes suspensas.
Em um mês, sua fazenda produz cerca de 6.800 kg de folhas verdes. “Mesmo quando está fazendo 46ºC lá fora, ainda conseguimos cultivar alimentos”, afirma Albright.
As fazendas verticais surgiram como uma solução potencial para problemas diversos, como insegurança alimentar, mudança climática e revitalização urbana. No entanto, sua viabilidade econômica é questionável.
Nos últimos cinco anos, quase US$ 4 bilhões (cerca de R$ 22,6 bilhões) em capital de risco foram investidos em grandes fazendas verticais internas, com alta dependência tecnológica e alto consumo de energia. Muitas dessas empresas —como a Plenty, apoiada por Jeff Bezos— declararam falência. (Bezos é dono do The Washington Post.) Atualmente, apenas algumas empresas de agricultura vertical ainda operam nos Estados Unidos.
“Estamos agora na versão 2.0 da agricultura vertical”, diz Nona Yehia, cofundadora da Vertical Harvest, a primeira estufa vertical hidropônica dos EUA, sediada em Jackson, Wyoming, com planos de abrir uma nova fazenda no Maine este ano.
Desertos alimentares e renovação urbana
Segundo o Departamento de Agricultura dos EUA, cerca de 53 milhões de norte-americanos vivem em “desertos alimentares”, com acesso limitado a alimentos saudáveis e acessíveis. O Distrito 2 de Houston é um desses desertos —um dos maiores do Texas.
A empresa Eden Grow Systems, com nove funcionários, vendeu dois de seus sistemas verticais para centros comunitários no distrito. Segundo o comissário Adrian Garcia, esses sistemas fazem parte de um plano de revitalização para amenizar o aumento dos preços de frutas e vegetais frescos no Condado de Harris.
Bart Womack, CEO da empresa, se vê mais como um inventor e futurista do que como um agricultor. Para ele, a agricultura vertical é uma forma de enfrentar vulnerabilidades no sistema alimentar, criando bolsões de segurança e resiliência alimentar pelo mundo. “Estou tentando trazer essa tecnologia para o público na esperança de que, ao atravessarmos tempos caóticos, existam pequenas ilhas onde as pessoas conseguiram se adaptar”, diz Womack, cujas torres verticais pequenas custam US$ 5.000 (aproximadamente R$ 28,2 mil) cada.Em 2022, a Eden Grow Systems começou a trabalhar com a Força Espacial dos EUA para fornecer alimentos frescos na Ilha de Ascensão, uma base aérea remota no Atlântico. A Space Force está testando os sistemas para garantir alimentos em um local onde os suprimentos chegam apenas a cada três meses. Uma das maiores demandas na ilha são as frutas vermelhas.
A tecnologia é baseada em pesquisas da Nasa, nos anos 1980, para alimentar astronautas no espaço. “A NASA descobriu que, ao aplicar uma névoa com 50 partes por milhão de nutrientes nas raízes, elas começam a agir como pulmões”, diz Womack. “As plantas crescem 30% mais rápido do que as que absorvem água pelo solo.”
Prédios comerciais vazios são uma opção para essas fazendas, pois as torres da Eden Grow Systems são modulares, móveis e podem ser montadas em qualquer lugar com água e energia suficientes. No fim de 2024, mais de 20% dos escritórios nos EUA estavam desocupados, 3,6 pontos percentuais acima de cinco anos atrás, segundo relatório da Moody’s.
O famoso edifício Niels Esperson, em Houston, é um desses prédios vazios. Womack está tentando estabelecer uma fazenda vertical independente no porão, que antes abrigava uma creche, como um espaço comunitário empreendedor. Ele espera expandir para os andares superiores no futuro. “Com nossos sistemas, podemos entrar nos prédios e, sem fazer grandes reformas estruturais ou adicionar novos recursos, começar a cultivar”, afirma.
Nem todos veem potencial nesse modelo de transformação de escritórios em fazendas: Eric Stein, diretor executivo do Center of Excellence for Indoor Agriculture, aponta que a Eden Grow Systems fabrica sistemas de produção muito pequenos. Ele duvida da viabilidade de usar espaços comerciais em larga escala, por causa do alto custo de aluguel e das adaptações necessárias. “Espaços comerciais são feitos para pessoas, não para plantas”, afirma.
Economizando água enquanto se cultiva
Em Phoenix, 72% da água doce é usada para a agricultura, e os agricultores enfrentam a pior crise hídrica da história do Arizona, devido à longa seca que reduziu os reservatórios do rio Colorado.
A Homer Farms busca produzir em larga escala usando apenas uma fração da água da agricultura tradicional. O cofundador Zhihao Chen construiu uma fazenda vertical em uma antiga oficina mecânica, localizada em um bairro residencial e industrial —um dos 43 desertos alimentares de Phoenix.
“Será que conseguimos uma solução que mantenha um nível adequado de produção de alimentos sem gerar uma sobrecarga significativa no nosso abastecimento de água?”, questiona Chen, enquanto passa por fileiras de vegetais sob luzes de LED multicoloridas.
Diferente das pequenas torres móveis de Womack, Chen e Chad Geelhood estão construindo fazendas urbanas de grande escala. A fazenda ocupa um galpão com estantes de 1,2 metro de largura, empilhadas a 3,6 metros de altura por 17 metros de comprimento. Segundo Chen, o design modular permite expansão.
“Nossa principal meta é montar operações em escala industrial”, diz Chen.
A empresa depende da venda dos produtos para distribuidores locais, restaurantes, cooperativas e de subsídios do estado e da cidade —não de capital de risco. A Homer Farms já recebeu subsídios do estado do Arizona e da cidade de Phoenix.
Eles estão prestes a iniciar uma nova fazenda vertical em outro deserto alimentar, no norte de Phoenix, em parceria com a Universidade Estadual do Arizona, a cidade de Phoenix e a companhia Saltwater River Project. O projeto contará com quatro fazendas em contêineres, produzindo cerca de 10,4 mil kg de folhas verdes por ano —20% delas serão distribuídas gratuitamente à comunidade.
A empresa também coleta resíduos alimentares dos clientes e os processa com um biodigestor anaeróbico que usa microrganismos para transformar o lixo em biogás e fertilizante líquido.
“Vamos criar um projeto piloto que possa ser replicado em Phoenix e outras cidades do condado”, diz Rosanne Albright, gestora de programas ambientais da cidade.
Fazendas verticais também beneficiam áreas rurais
Na Costa Leste —em Westbrook, no Maine— a Vertical Harvest está abrindo uma fazenda vertical hidropônica de 4.600 metros quadrados em um prédio de aço e vidro de seis andares. Como o estado tem uma estação de cultivo curta, a maior parte dos alimentos é importada. Um relatório de 2024 revelou que apenas 3,4% dos gastos públicos com alimentação são destinados a produtos locais.
“Uma alface típica viaja 3.200 quilômetros até chegar ao prato”, diz Yehia. “Nós levamos do cultivo ao garfo em 24 horas, no pico do valor nutricional.”
Para Yehia, a agricultura vertical também gera empregos. O número de fazendas e agricultores nos EUA segue em queda. A nova unidade no Maine empregará uma nova geração de agricultores urbanos, incluindo pessoas com deficiências de desenvolvimento.
“Estamos construindo um movimento. Um sistema alimentar local”, diz Yehia. “Esperamos que o modelo que estamos desenvolvendo no Maine se espalhe por cidades de todo o país.”
A True Garden, em Mesa, busca o mesmo com um modelo barato e escalável, sem depender de automação ou luzes caras, usando a luz natural de uma das cidades mais ensolaradas dos EUA. As torres custam US$ 600 (cerca de R$ 3.400) e podem ser colocadas em escolas, centros comunitários e prédios abandonados.
“Cidades em todo os EUA têm prédios vazios que podem virar condomínios de alimentos”, diz Albright. “Eu imagino que toda cidade metropolitana tenha sua fazenda urbana.”
Para Stein, o crescimento da agricultura vertical não é apenas possível, mas necessário.
“Acho que não podemos nos dar ao luxo de não fazer isso funcionar”, afirma. “Construir resiliência e centros de produção nas cidades é fundamental. Quase temos que fazer isso, de alguma forma.”