Em 2001, as receitas arrecadadas pelo governo federal com a cobrança de royalties sobre a mineração e sobre a extração de petróleo e gás equivaleram a 0,3% do PIB daquele ano. Em 2010, ainda antes do início da exploração do pré-sal, chegaram a 0,6% do produto. Já em 2024, esse montante atingiu 1,0% (R$ 118,8 bilhões), devendo subir mais um pouco nos próximos anos, para cerca de 1,1% do PIB, segundo projeções publicadas no começo deste ano no Observatório de Política Fiscal do FGV Ibre.
Embora sejam coletados pela União, cerca de 60% desses recursos são repassados para estados e municípios. Mas essa distribuição é altamente desigual: alguns poucos estados (Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Pará e Minas Gerais) e alguns poucos municípios (tais como Maricá/RJ e Ilhabela/SP) recebem boa parte desses recursos, por abrigarem as atividades extrativas (ou de suporte) ou por serem “confrontantes” (no caso da exploração de petróleo offshore, em alto-mar).
Esses poucos entes federativos subnacionais que recebem boa parte dos royalties costumam defender essa distribuição altamente desigual usando como justificativa o fato de que esses valores pagos a eles corresponderiam a uma espécie de “compensação” pelos potenciais impactos ambientais e socioeconômicos negativos gerados por essas atividades, incluindo o risco de incidentes.
Contudo, como bem argumentaram Sérgio Gobetti, Rodrigo Orair, Rodrigo Serra e Fernando Gaiger em um texto para discussão do Ipea publicado em 2020, essa ideia de compensação por possíveis danos é equivocada. Os royalties devem ser entendidos como uma remuneração pela exploração, por agentes privados, de recursos não renováveis que são públicos. E, pela legislação brasileira, todos os ativos minerais que estão no subsolo e nas áreas costeiras pertencem à União (e não aos estados e municípios onde estão essas jazidas).
Em 2012, vislumbrando um aumento dessas receitas com o advento da exploração do pré-sal, o governo federal propôs e aprovou no Congresso Nacional a lei 12.734, definindo uma distribuição menos desigual, ao longo de um período de transição de sete anos, das receitas associadas à exploração de petróleo e gás natural em alto-mar. A própria União abdicaria de uma parcela dessas receitas para que ela fosse distribuída dentre todos os estados e municípios brasileiros (na contramão da experiência internacional, que aponta que essas receitas com royalties de exploração em alto-mar acabam ficando em boa medida com o governo federal).
Contudo, no começo de 2013, alguns estados brasileiros, como o Rio de Janeiro, ingressaram no Supremo Tribunal Federal com diversas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs), impedindo que a nova lei entrasse em vigor. Em 2020, o STF chegou a indicar que pautaria essa discussão, mas veio a pandemia e isso paralisou o processo. Em meados de 2023, o STF encaminhou essa discussão para um órgão interno de resolução de litígios, mas, na prática, nada aconteceu desde então.
Passados quase 13 anos desde a aprovação da lei 12.734, é preciso que esse julgamento aconteça o quanto antes. Idealmente, o STF deveria validar a lei de 2012, uma vez que a concentração elevada de receitas de royalties em alguns poucos estados e municípios não se justifica e ainda pode gerar diversos efeitos negativos, associados ao mal uso desses recursos ensejado por aquilo que se chama de “paradoxo da abundância”.