Um relógio parado acerta a hora duas vezes por dia. Mas ninguém o usa para se orientar. Na vida financeira, curiosamente, muitos fazem justamente isso: seguem conselhos congelados no tempo, com orgulho de nunca mudarem de opinião.
Recentemente, um leitor me repreendeu por eu ter recomendado, anos atrás, um índice de renda fixa diferente do que hoje considero mais interessante. O tom era de bronca — como se mudar de ideia fosse sinal de fraqueza, ou pior, de incoerência. Me espanta que ainda cause surpresa o fato de uma boa disciplina de investimento exigir justamente isso: a capacidade de mudar de opinião. O cenário econômico muda, os preços mudam, os riscos também. Se você insiste em manter a mesma visão diante de um novo contexto, não está sendo coerente — está apenas batendo a cabeça na parede.
Se você me acompanha há mais tempo, sabe: tento não carregar dogmas, carrego dúvidas bem cultivadas. Investir exige isso. Como disse Bertrand Russell, “a sabedoria é saber que se pode estar errado”. No mercado, quem se apega a certezas acaba sendo abandonado pela realidade.
Em mais de 26 anos atuando com investimentos, ajudei muita gente a construir patrimônio. E sabe qual é o denominador comum entre quem mais prosperou? Não é quem acertou a aposta que rendeu mais. Essa só é boa para contar no churrasco. É quem errou — e aprendeu — mais rápido. Não se trata de evitar erros a todo custo, mas de reconhecê-los antes que se tornem irreversíveis. Como dizia Montaigne, “preferimos o erro habitual à verdade desconhecida”. E isso vale ouro — ou prejuízo.
Nas minhas aulas eu sempre dizia aos meus alunos de graduação: no mercado financeiro, ganha mais quem descobre mais rápido onde se está errando agora. E a todo instante, estamos cometendo algum erro. Não digo que estejamos perdendo dinheiro o tempo todo, mas que poderíamos ter uma carteira melhor e muitas vezes teimamos em mudar.
Mudar de ideia não é sinônimo de instabilidade. É sinônimo de evolução. Já vi muitos investidores decidirem manter tudo na poupança por medo da oscilação. Depois, percebem que o dinheiro estacionado ali mal vence a inflação. O mesmo vale para aquela posição que você insiste, mas que no fundo sabe que está errada. Quando se resolve rever a decisão, alguns se sentem envergonhados, como se estivessem traindo a si mesmos. Mas qual é o erro maior: mudar de rota ou seguir direto rumo ao que não faz mais sentido?
Confundir consistência com teimosia é uma armadilha comum. Nietzsche dizia que “as convicções são inimigas mais perigosas da verdade do que as mentiras”. No mercado, essa frase ganha ainda mais peso. Conheço investidores brilhantes que viraram reféns da própria narrativa — incapazes de reavaliar o caminho, apenas para manter uma coerência superficial.
Mudar de opinião em público exige coragem. É desconfortável, sim. Mas é muito mais nobre do que fingir estar certo só para preservar uma imagem. No meu caso, tenho 8 anos de histórico de opiniões escritas aqui nesta coluna. Prefiro me expor ao ridículo da mudança do que à arrogância da estagnação.
Errar cedo, inclusive, é uma vantagem competitiva. Quando você aprende aos 28 o que outros só perceberão aos 48, tem 20 anos a mais para investir melhor. Não à toa, muitos dos grandes gestores do mundo falam mais de seus erros do que de seus acertos. São os erros que forjam a estratégia, o olhar clínico e a disciplina.
Você, leitor, também não precisa ter todas as respostas. Mas precisa ter disposição de fazer melhores perguntas. A humildade intelectual é o que separa o investidor maduro do mero apostador.
No fim das contas, investir é como remar num rio que muda de curso. Ficar preso ao mapa antigo só porque foi caro ou bonito é receita para naufragar. Melhor ir ajustando a bússola — e aceitando que, sim, errar faz parte do caminho certo.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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